DEZ ANOS SEM DOM NIVALDO
PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO (pe.medeiros@hotmail.com)
Na próxima quinta-feira, dia 10 de novembro, estaremos rememorando dez anos de vida em plenitude de nosso saudoso arcebispo Dom Nivaldo Monte. Uma década sem suas palavras sábias, de puro afeto, revestidas de sincera ternura, ditas com meiguice e alegria, pronunciadas na maior singeleza, para não afugentar nenhum dos seus interlocutores. Era assim Dom Nivaldo: franzino, “xoxinho”, segundo a sua própria expressão, exíguo fisicamente, mas gigante na simplicidade e no amor. O nosso “Pequeno Príncipe”, não o de Exupéry, cuidando dos baobás, mas o de Natal, regando almas, adubando corações, semeando paz e esperança, sorrindo para todos com esplendor divino. Em 1963, São João XXIII o elegeu bispo da Igreja de Cristo.
Emaús ressente-se da falta de seu poeta, tem saudades do seu jardineiro, vive a solidão do entardecer, sem ouvi-lo chamar cada um de “Nêgo véio”. Sua erudição e ciência, sua espiritualidade tão elevada não o distanciaram dos seres humanos, mas o aproximaram dos mesmos para ungi-los com o divino. “O cristianismo tem o diferencial do perdão”, repetia-nos o Santo de Emaús, cada vez que alguém se mostrava intolerante com as fraquezas do próximo. “Por ser humano, cada um tem o direito de ter o seu pecado. Deus sabe disso”, alertava ele a quem destilava condenação.
“Tudo passa, no entardecer da vida, permanece apenas o amor”, costumava lembrar, quando percebia os ventos da vaidade de algum de seus padres. “O homem só é grande, quando se faz pequeno”, dizia-nos. Assim, imitará Cristo, que sendo Deus onipotente, fez-se homem e veio ao mundo na fragilidade de uma criança. Aliás, gostava de afirmar que “a infância é sílaba divina, manifestação de sua pureza”. Amava as crianças e com elas brincava, a tal ponto de também colecionar lancheiras de aniversários. Prezava a frase de Tagore: “Cada criança que vem ao mundo, traz uma mensagem, Deus não se arrependeu ainda de ter criado o homem”.
“Ah, nêgo véio, amo tanto estas terras! Elas são um manto divino que nos envolve e protege”. Para nosso inolvidável amigo, o solo é sagrado por ser dádiva de Deus. Não deverá jamais ser regado pelo sangue, mas pelo suor agradecido de quem trabalha, e sabe que dele brota o novo maná, que nos alimenta na caminhada da vida. De nosso pastor, podemos dizer como Teilhard de Chardin: “Aquele que amar apaixonadamente Cristo latente na força da terra, esta, maternalmente, erguê-lo-á em seus braços gigantes e o fará contemplar o rosto de Deus”.
Com fidelidade e perseverança Dom Nivaldo anunciou o Evangelho, edificou a Igreja. Era afável e misericordioso com os simples e necessitados. Condoía-se ao ver famintos e miseráveis, despossuídos de esperança e futuro, vítimas do egoísmo daqueles que ignoram Deus e seus ensinamentos. Como Bom Pastor, cuidou das ovelhas sofridas no corpo ou na alma, trabalhou e rezou contrito pelo bem dos seus diocesanos, queridos filhos espirituais. Viveu o profundo significado de ser sacerdote e bispo. Trazia permanentemente Cristo em seu coração. Assumiu o amor de Jesus, um encontrar-se no seu mistério, oferecendo seu corpo frágil, para estar no meio do seu povo, sentir as suas angústias e assumir até na doença o que o Senhor sofreu para dar a vida por nós. As palavras do ritual da ordenação episcopal foram vividas plenamente por Dom Nivaldo: “Vela, pois, por todo o rebanho dos fiéis em nome do Pai, de quem és imagem; em nome do Filho, cuja missão de mestre, sacerdote e pastor exerces; e em nome do Espírito Santo, que dá a vida à Igreja de Cristo e fortalece a nossa fraqueza”!
No silêncio do Mosteiro de Sant´Ana, onde a natureza reina placidamente como sorriso de Deus, repousa nosso inesquecível Dom Nivaldo. Os pássaros alçam seu voo realizando a dança da alegria, o cheiro das plantas e da terra espargindo no ar, velando a sepultura simples de um sábio e santo. O profeta Daniel, antecipando nossa ressurreição, escreveu: “Os que estiverem dormindo no pó da terra acordarão e os que educaram muitos para a bondade e a justiça brilharão para sempre como estrelas” (Dn 12, 3).